sexta-feira, 29 de setembro de 2017

Barcela, a praia mais linda do mundo 'as I know it'


Já lá vão muitos anos, descobri as praias do Grove, "playas a todos los ventos", a dar para a Ria onde centenas de plataformas mexilhoeiras decoram as águas muitos azuis que banham areais pristinos de areia fina, clara, limpissima. Conchas pequenas de múltiplos moluscos formam faixas deixadas pelas marés, búzios e caracóis de todas as cores, lapas de todos os tamanhos, mexilhões e belissimas conchas de Santiago, e beijinhos* em fartura, fáceis de encontrar. Um gozo.

Antes da península, a Pragueira já é uma aproximação ao paraíso - um arco extenso de areias brancas e planas, rochedos cheios de vida, águas que deixam ver os fundos dourados ou esmeralda.

Cormorans na Pragueira.


Depois a Lanzada, com areal a perder de vista e uma esplanada para almoço marinho com vistas.


Na península, é a Barrosa, a Area Grande, a Barcela, a Area das Pipas. De todas, a Playa de A Barcela é a minha escolha, a mais linda do mundo que conheço. Estive lá agora a matar saudades.



Entre o pinhal e o mar povoado de bateas, um paraíso de sossego e natureza, cores e sons.


Água bem fresca, claro, mas tão suave como um lago.


Onde a costa fazia ũa enseada 
Curva e quieta, cuja branca areia 
Pintou de ruivas conchas Citereia


Em poucos minutos uma colheita abundante :)

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* Trivia monacha, cowry/cowrie shells, porcelaine grain de café - gastrópode das praias atlânticas ocidentais.

segunda-feira, 25 de setembro de 2017

Poesia de Robert Burns (1759-1796) - the fears all, the tears all


Edina! Scotia's darling seat !
All hail thy palaces and tow'rs;
Where once, beneath a Monarch's feet, 
Sat Legislation's sov'reign pow'rs ...
(*)

                                         [Edina é o nome poético, latinizado, de Edimburgo]


Não é fácil ler Burns, e muito menos traduzir.  O uso da língua é genial como em Shakeaspeare, mas Burns escreve no seu dialecto escocês, misto de germânico e gaélico celta  ('mang' por 'among', 'nicht' por 'night', por exemplo) e uma gramática retorcida como é próprio da melhor poesia. Muitos poemas são longos, repetindo estribilhos em forma de canção, intencionalmente. Publico aqui só extractos; em todos é evidente o romantismo exacerbado que fascinou Pessoa e Jorge de Sena.

De Sensibility (1791):

Sensibility, how charming,
Dearest Nancy, thou canst tell;
But distress, with horrors arming,
Thou alas! hast known too well !


                                    Sensibilidade, que encanto,
                                    Querida Nancy, bem o sabes;
                                    Mas angústia, de horrores armada,
                                    Conheces tu, ai!, e por demais.


De To a Mountain Daisy (1786) :

Wee, modest, crimson-tippèd flow'r,
Thou's met me in an evil hour;
For I maun crush amang the stoure
            Thy slender stem:
To spare thee now is past my pow'r.
            Thou bonie gem.


                                      Frágil, modesta, rosada flor
                                      Deste comigo em malvada hora;
                                      Pois derrubei e pisei na poeira
                                                 O teu tenro caule:
                                      Salvar-te agora já não posso,
                                                  A ti, linda jóia.


De Despondency, an Ode :

Ye tiny elves that guiltless sport,
       Like linnets in the bush,
Ye little know the ills ye court,
       When manhood is your wish!
              The losses, the crosses,
                      That active man engage;
              The fears all, the tears all,
                      Of dim declining Age!


                            Vós frágeis elfos que brincais, inocentes,
                                    Como os pintarroxos no bosque,
                            Pouco sabeis dos males que vos esperam
                                    Quando vosso desejo é ser humanos.
                                           As perdas, as cruzes,
                                                   Em que os humanos se empregam
                                           Os medos, as lágrimas tantas
                                                   Da idade em frágil declínio !

De O, were my Love :

O were my love yon Lilac fair,
Wi' purple blossoms to the Spring,
And I, a bird to shelter there,
When wearied on my little wing
.

                           
                                    Oh fosse o meu amor um lilás belo
                                    Com roxos botões na Primavera
                                    E eu, um pássaro que nele me abrigasse
                                    Quando cansado da minha asita.




Ae fond kiss, and then we sever;
Ae fareweel, alas, for ever!


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(*) Podia ser:
Edina ! Sede querida da Escócia !
Que todos saúdem os palácios e as torres
Onde en tempos,  aos pés de um Monarca
Assentaram os poderes soberanos da Lei


quarta-feira, 20 de setembro de 2017

Myrie it is while sumer ylast
(Merry it is while summer lasts)


A mais antiga canção medieval inglesa de que há registo, do início do séc. XIII, é esta Myrie it is while sumer ylast cuja "partitura" em pergaminho está na Bodleian de Oxford.
É uma folha manuscrita inserida posteriormente num Livro de Salmos do séc. XII. Além dos rasgões, tem manchas de... lágrimas.

O texto anglo-saxão mostra muitas influências germano-nórdicas.

Myrie it is while sumer
ylast with fugheles song.
Oc nu neheth windes blast
and weder strong. Ei, ei!
what this nicht is long. And
ich with wel michel wrong
soregh and murne and fast.


                                          Divertido é enquanto o Verão
                                          dura com o canto das perdizes.
                                          Mas agora ventos do Norte rugem
                                          e o clima é violento. Ai, ai !
                                          como esta noite é longa. E
                                          eu com os meus graves erros
                                          sofro e choro e renuncio.
                                                                [trad. minha, com muitas liberdades]

Do Ensemble Balladona, uma versão credível:



Bom Outono !


domingo, 17 de setembro de 2017

Calton Hill, a "acrópole" de Edimburgo, visita ao crepúsculo


Como não sou de Ásias nem Américas, o ponto alto das minhas viagens surge em sítios como este, europeus até ao tutano, cheios de evocações, belos como o eterno Capitólio ou os castelos do Reno. Este ano não falhei - em visitas anteriores a Edimburgo ficava sempre pela Royal Mile e pouco mais.

Princes Street vista da base de Calton Hill, à entrada da escadaria.

Ao fundo da Princes Street, perto do terminal do tram, há uma escadaria que sobe para o monte Calton, a colina mais elevada da cidade, símbolo escocês que foi sendo construído com intenção de respirar um ambiente clássico e mesmo épico. A "Scottishness", como se traduziria a malfadada e vazia 'portugalidade'.´

Um pouco mais acima e vê-se quase toda a cidade - o Castelo lá ao fundo.

O monumento a Dugald Stewart compõe uma das melhores vistas. Stewart foi um professor e pensador de relevo na Escócia tardo-iluminista séc XIX, que marcou com o seu progressimo militante.


Mas afinal o maior interesse de Calton Hill é como miradouro urbano. Não faltam belas fotos, as minhas ficam aqui, na luz dificil de um entardecer enevoado.





O National Monument é um memorial de 1823 dedicado aos soldados escoceses que morreram nas batalhas contra o exército de Napoleão. A ideia era construir um mausoléu à imagem do Parténon, mas a obra ficou neste estado por falta de fundos - uma vergonha nacional, nunca resolvida. Eu até acho que está magnífico assim, nada é mais belo que uma ruína, sinal da efemeridade.

Há ainda a (feia) torre-telescópio do Monumento a Nelson, o herói de Trafalgar. Tem algum interesse histórico por ter sido usada como sinal à navegação no porto de Leith e no Firth of Forth: conjugada com um tiro de canhão do castelo, uma bola no topo da torre dava a hora certa (às 13h) ao cair do topo do mastro. Um "audiovisual" tecnológico de 1853, hoje reduzido à componente visual - a esfera ainda cai.
Pode-se subir ao alto para vistas mais amplas. Não tenho pernas para tanta escada.

Há mais em Calton Hill: um cemiterio onde esta David Hume, um obelisco aos mártires rebeldes escoceses, a Governor's House que era parte da antiga prisão... como muitos outros montes mais ou menos sagrados, Calton Hill teve um culto mítico e continua ainda a ser um simbolo.

[esta não é minha]


quinta-feira, 14 de setembro de 2017

Fim de época balnear entre rochedos e lapas


Nesta quarta feira esteve um dia perfeito à beira-mar: uns 23º, sem vento, maré vaza ao meio dia, praia deserta. Desci descalço pela areia directo a molhar os pés, a água vinha suavemente acariciar a areia e estava fresca sem ser gélida.


Com o mar recuado fica à vista um labirinto de rochas esculpidas com pocinhas e uma população de algas, mexilhões e lapas cada vez mais abundante. O que vai faltando é areia fina, que o mar leva deixando uma cobertura de seixos que magoa.  Está-se melhor calçado.






Não falta variedade de texturas e cores.

E um inevitável splash para acabar em beleza:



Como eu gosto disto ! Regresso à infância, eu sei.


segunda-feira, 11 de setembro de 2017

Culross, bonita aldeia escocesa na margem do Firth of Forth


Em Culross sob um céu escocês típico - ameaço de chuva com clareiras.

Se não fosse um arzinho especial, fino e leve, e uma sensação indefinível de setentrional, podia ser uma aldeia portuguesa. Varandas e escadarias floridas, fachadas caiadas de branco mas alegradas por uma ou outra mais colorida, cortinas nas janelas, calçada ingreme de pedras, uma Câmara de granito com torre central e um mosteiro antigo lá no alto, tudo rodeado de verdura. Mas quando a vista se espraia sob os telhados e chaminés, no miradouro, e pelo Firth of Forth, há na paisagem uma respiração de quase Ártico na quietude, no isolamento, no aparente abandono - não há trânsito nem camionetas, nem vozes humanas, nem ruído de obras. Só pássaros, sussurros do vento e da folhagem, um som de fundo da água a fluir no largo estuário, e aquela luz coada, discreta, em tons frios azul e verde.

Meados de Agosto, e quase ninguém. Estava tudo em Edimburgo no Festival?

A 'típica' empena lateral triangular com chaminés.




Há um vago 'feeling' de parentesco desta aldeia com as da Península Iberica. Nada a ver com as aldeias inglesas.


A casa mais diferenciada, de influência nórdica, talvez holandesa ou escandinava.

Beira Baixa ? Alto Alentejo ?

Não, esta não é mediterrânica.

O céu ficou pesado, choveu, passou. Muito 'Highlands'.

Na parte alta da vila, uma varanda panorâmica sobre o rio Forth:




Culross Abbey

Tendo sido Viking e Celta mas nunca Romana, a Escócia escapou à primeira vaga de cristianização. Mas logo a seguir, quando os Romanos abandonaram a Britannia desde o séc. V, os Celtas começaram a converter-se (o Livro de Kells de Iona data de c. 800) num processo que se prolongou até ao séc. X. Um monge do séc. V (São Servo ou São Servano) andou por aqui a pregar, e deu origem a muitas lendas.

A Abadia de Culross foi fundada em 1217 sob o 7º conde de Fife, afiliada à ordem de Cister como na maioria da Escócia. O que resta de pé passou desde 1633 a igreja paroquial da Church of Scotland.

A bandeira nacional a drapejar no alto da torre.

Um recanto íntimo onde os musgos e as amoras nas silvas parecem contar segredos com muitos séculos.


Junto a um muro de silvas carregadinhas de lindos frutos que ninguém apanha:

Na tearoom 'Biscuit Café ', inevitavelmente, o ritual do chá com scones; talvez a compota seja das mesmas amoras ?

Destes momentos também se faz viagem.


Na despedida, junto ao cais de acesso ao Forth, jogos de luz, àgua, céu, linhas de fuga, duas pessoas também fascinadas.



You sylvan powers that rule the plain
Where sweetly winding Forth a glides
Conduct me to those banks again
Since there my charmimg Mary bides.


E a terminar um pouco de gaélico, que me soa lindamente - é uma língua musical e de sonoridade agradável:
"O Barqueiro", Fhear a Bhàta